4 x 2 perguntas para o João Seixas
Há algum etnólogo português que tenha feito (ou esteja fazendo) a decomposição das fábulas populares portuguesas em funções? Também «Leonardo [da Vinci] “decompôs” a máquina em elementos. Em “funções”.» As cartas de Propp, páginas 64-69, GRAMÁTICA DA FANTASIA por Gianni Rodari (summus editorial) (colecção, novas buscas em educação vol. 11). Era fantástico haver ‘um etnólogo’ que o fizesse. Cito [João Seixas, A Ficção Científica PORTUGUESA e o OMPHALO MUNDI], «se efectivamente se quer criar uma literatura de Ficção Científica própria, com uma voz nacional característica, (...) tal Ficção Científica vê-se praticamente compelida a surgir ex novo, não da labuta de anos, mas da pena de um autor isolado que, enciclopédia viva da Ficção Científica que é, saiba desmontar, negar e inverter as respostas tradicionais do género aos tradicionais problemas pelo género tratados.» fim de citação. ...Da quota que fiz só troco ‘autor’ por etnólogo. O que achas? Na Periferia do V Império (3) o António de Macedo escreveu, e cito «José de Matos-Cruz recria a história de Portugal do século xx escolhendo 100 acontecimentos, um por cada ano, para transformá-los em narrativas, (...) além disso instala-se uma certa inquietação no leitor quando começa a perceber que por detrás do rigor histórico dos cenários, das personagens, dos comportamentos, da linguagem, dos acontecimentos retratados em cada ano, há um Portugal virtual que tem tudo a ver com este mas «revisto» de uma certa maneira, uma virtualidade que se actualiza de modo a fornecer uma «chave»...». fim de citação. Poderá esta «chave» ser uma ‘equivalência’ à decomposição dos elementos da máquina de Leonardo, e às funções nas fábulas de [Vladmir] Propp [etnólogo ‘soviético’]? Não se pode pegar nos textos FC & F já escritos em português, por portugueses, e decompo-los em elementos, funções ou chaves? Passo a citar Gianni Rodari, pág. 72, 73, Fábulas em “chave obrigatória”, Gramática da Fantasia: No interior de cada “função” fabulística são possíveis, como vimos, infinitas variações. A técnica da variação, entretanto, pode ser aplicada à fábula inteira, da qual se pode imaginar uma modulação, uma transposição de uma tonalidade a outra. (...) A velha fábula, percutida pela nova chave, adaptando-se à nova execução, fornecerá sons surpreendentes. (pág. 49, As fábulas populares como matéria-prima) As fábulas populares entraram como matéria-prima em diversas operações fantásticas: do jogo literário (Straparola) ao jogo de corte (Perrault) – do romantismo ao positivismo – para acabar, em nosso século, na grande empresa da filologia fantástica, que permitiu a Italo Calvino dar à língua italiana o que ela não recebeu no século 18, por falta de um Grimm. (pág.60, Fábulas copiadas) Um jogo mais complexo é o da cópia, com o qual se obtém de uma velha fábula uma fábula nova, reconhecível ou totalmente nova. Este procedimento tem precedentes famosos, entre os quais a ilustríssima cópia joyceana da Odisséia. Mas não é difícil reconhecer um mito grego nas Gomme de Robbe-Grillet e, se procurarmos, encontraremos alguns contornos bíblicos nas tramas dos contos de Moravia. Estes exemplos, obviamente, não comprometem as infinitas tramas obtidas uma das outras pela simples mudança de nomes e transposição de calendários. Fim de citação. Isto tudo dito é para tu [tu =João Seixas] tentares responder ao Luís Rodrigues que ‘nos’ fez a seguinte pergunta: – Ah, mas o que é essa fc de outra maneira? Deixando de ser fc? Luís Santana
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